RUDÁ RICCI: Um PT e vários petistas


Acabo de ler três livros sobre e de petistas (embora um deles o autor não se declare). Emparelhados, revelam um ranking, do amoroso (Juarez Guimarães) ao militante oficial (Zé Dirceu), passando pelo olhar crítico (Lincoln Secco).

Juarez Guimarães escreve um livro perplexo e desejoso: A Esperança Crítica, Editora Scriptum, 2007, 144 páginas. Sempre gostei do estilo e da competência de Jaurez, desde que o conheci na Democracia Socialista (DS), corrente interna do PT. Nas reuniões na sede do jornal Em Tempo, Juarez era aquela figura emblemática, tímida e respeitada, cuja redação era humilhante, tal o virtuosismo literário. O tema de Juarez é a institucionalização acelerada do PT e seus riscos. Uma tentativa quase desesperada de compreender os riscos do amadurecimento do seu partido que teve no pragmatismo sua expressão mais visível. Juarez propõe a não capitulação ao status quo, mas demonstra, nas entrelinhas, uma enorme preocupação. O PT se tornou poder, cochicha o tempo todo no seu próprio ouvido. Frei Betto estava errado quando afirmou que o problema do PT é que ele era governo (com Lula), mas não poder. O livro de Juarez admite sutilmente que o PT é poder. Tanto que se pergunta os motivos de Lula ser tão popular ao mesmo tempo em que se nota um grande mal-estar nas esquerdas. A resposta dele é: Lula tornou-se sujeito da República imperfeita do Brasil. Um amálgama, uma simbiose. O PT se transformou.

Mesmo assim, trata-se de um texto apaixonado, que lista os intelectuais de peso (Paulo Freire, Florestan, Marilena Chauí, Antonio Cândido) e como o partido esteve e está em todas iniciativas inovadoras da política tupiniquim e em todos movimentos sociais relevantes, desde sua fundação.

Já o livro de Zé Dirceu (Tempos de Planície, Editora Alameda, 382 páginas, 2011) é formulado por um dirigente auto-controlado. Uma coletânea de seus artigos em defesa do discurso oficial do PT. O texto de Dirceu transpira a perda do radicalismo petista, da inovação. Quando trata da reforma política, fica no meio do caminho. Propõe mudanças para que tudo fique como está. Não pensa o status quo, apenas tenta corrigir seus erros mais grosseiros. Sugere, por exemplo, a mudança do papel do Senado, mas não consegue delinear a direção desta mudança. E alerta que não é contra sua extinção, pauta clássica da esquerda mundial (que não tolera a estrutura bicameral). O discurso de Zé Dirceu alimenta os fantasmas de Juarez.

Finalmente, o livro do historiador Lincoln Secco (História do PT, Ateliê Editorial, 314 páginas, 2011). Desde a ilustração inicial (mãos erguidas que se transformam em estrelas), o livro estampa as marcas de um militante. Secco demonstra a grande mudança na trajetória petista. Mergulha nas mudanças de rumo de algumas correntes ou organizações internas, como a Libelu que, desde a criação da Articulação dos 113, procurou ingressar na corrente majoritária de Lula e criticava duramente as outras correntes de origem trotskista. Retoma a tradição dos núcleos de base e sugere que não se trata de transposição das células das organizações de esquerda. Antes, mantinham identidade com as CEBs. Avança sobre a pluralidade de forças que tiveram peso na criação do partido ao longo do território nacional: igreja numa localidade, organizações trotskistas em outro, sindicalistas num terceiro, e assim por diante. O livro é um achado, mas uma leitura para iniciados.

O PT encontra-se nesta encruzilhada que merece tanta atenção que gerou três livros que se cruzam.

O problema é que a angústia de Juarez aumenta ao cabo da leitura dos livros.



Fonte: http://rudaricci.blogspot.com/2011/11/um-pt-e-varios-petistas.html

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